terça-feira, 28 de julho de 2009

Educação e Esperança

Educação e Esperança

Uma coisa é a ação educativa de um educador desesperançado e outra é a prática educativa de um educador que se funda na interdisciplinaridade. O primeiro nega a essência de sua própria prática enquanto o segundo explícita certa opção metodológica e epistemológica.

A natureza esperançada da educação, por outro lado, se funda em determinadas qualidades que, constituídas no processo da formação da existência humana, algo maior do que a experiência vital, a conotam.
Na verdade, só o ser que, fazendo-se socialmente na História, se pode esperar que dê exemplos de máxima grandeza moral, de transbordante bondade como também testemunhos de absoluta negação da decência, da honradez e da sensibilidade humana.
Consciência do outro e de si como um ser no mundo, com o mundo e com os outros, sem a qual seria apenas um ser aí, um ser no suporte. Como presença consciente no mundo não posso escapar à responsabilidade ética no meu mover-me no mundo. Num mundo a que faltasse a liberdade e tudo se achasse preestabelecido não seria possível falar em esperança.
A matriz da esperança é a mesma da educabilidade do ser humano: o inacabamento de seu ser de que se tornou consciente. Seria uma agressiva contradição se, inacabado e consciente do inacabamento, o ser humano não se inserisse num permanente processo de esperançosa busca. Este processo é a educação.
Mas precisamente porque nos achamos submetidos a um sem-número de limitações – obstáculos difíceis de serem superados, influências dominantes de concepções fatalistas da História, o poder da ideologia neoliberal, cuja ética perversa se funda nas leis do mercado – nunca, talvez, tenhamos tido mais necessidade de sublinhar, na prática educativa, o sentido da esperança do que hoje. Daí que, entre saberes vários fundamentais à prática de educadores e educadoras, não importa se progressistas ou conservadores, se salienta o seguinte: mudar é difícil, mas é possível.
Minha vontade de mudar o mundo não é suficiente para fazê-la. Posso, inclusive, contradizer-me na minha prática, obstaculizando a própria mudança. O mesmo se pode verificar com o educador conservador. Em certo momento, sua ação pode trabalhar contra seu projeto ideológico e político de manter as coisas mais ou menos como estão.
Saber, portanto, que mudar é difícil, mas é possível é tão fundamental ao educador progressista, como ao educador ou educadora reacionária. É neste sentido que ambos, o educador progressista como o conservador, precisa atuar coerentemente. O primeiro, com o seu sonho de transformação do mundo; o segundo, com seu projeto alienante de imobilização da História. O progressista, criticamente inserido em formas de ação e em políticas pedagógicas realizando-se em coerência com a compreensão da História como possibilidade, o conservador, autoritário, acrítico, de direita ou de esquerda, sem esperança e carente de sonho, perdendo-se, sem muita chance de se encontrar, numa compreensão determinista da História.
Há uma espécie de “nuvem cinzenta” envolvendo a História atual e afetando as diferentes gerações, que é a ideologia fatalista que, despolitizando a educação, a reduz a puro treinamento no uso de destrezas técnicas ou de saberes científicos. A educação já não é formar, é treinar.
Para mim, a briga pela atualização do sonho, da utopia da criticidade, da esperança é a briga pela recusa, que se funda na justa raiva e na ação político-ética eficaz, da negação do sonho e da esperança.
Nenhuma realidade social, histórica, econômica é assim porque está escrito que assim seja.
Enquanto presença na História e no mundo, esperançadamente luto pelo sonho, pela utopia, pela esperança, na perspectiva de uma Pedagogia crítica. E esta não é uma luta vã.

(Paulo Freire)

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